Os
garotos da rua resolveram brincar de governo, escolheram o presidente e
pediram-lhe que governasse para o bem de todos.
- Pois não – aceitou
Martim. – Daqui por diante vocês farão meus exercícios escolares e eu assino.
Clóvis e mais dois de vocês formarão a minha segurança.
Januário será meu
Ministro da Fazenda e pagará o meu lanche.
-Com que dinheiro? – atalhou Januário.
-Cada um de vocês contribuirá com um cruzeiro por dia
para a caixinha do governo.
-E que é que nós lucramos com isso? – perguntaram em
coro.
-Lucram a certeza de que têm um bom presidente. Eu separo
as brigas, distribuo tarefas, trato de igual para igual com os professores.
Vocês obedecem, democraticamente.
-Assim não vale. O presidente deve ser nosso servidor, ou
pelo menos saber que todos somos iguais a ele. Queremos vantagens.
-Eu sou o presidente e não posso ser igual a vocês, que
são presididos. Se exigirem coisas de mim, serão multados e perderão o direito
de participar da minha comitiva nas festas. Pensam que ser presidente é moleza?
Já estou sentindo como esse cargo é cheio de espinhos.
Foi deposto, e dissolvida a República.
Carlos Drummond de Andrade. Contos Plausíveis. Rio
de Janeiro. Record, 1994.